Taveira's Advogados

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terça-feira, 1 de maio de 2012

Justiça e injustiça do sistema de cotas raciais



O sistema de cotas raciais em universidades, exclui pessoas igualmente desprotegidas pela sorte e fortuna, de acesso ao ensino superior.
Igualdade não se faz por tratamento formal isonômico para todos. Em sociedades plurais e assimétricas, a igualdade requer diferenciação de considerações e práticas jurídicas, segundo as  especificidades de cada um. Ou, pelo menos, de cada grupo social. Há quem denomine essas considerações e práticas de privilégios.
Num sentido, têm razão. Privilégio é atributo de um ou de poucos. Ora, se há determinados direitos que não podem ser universalizados acabam sendo, repito, nesse sentido, privilégios. É preciso distinguir, entretanto, o uso do termo para qualificar diferenciações arbitrárias como o favorecimento de ricos, direta ou indiretamente, por serem ricos, de famílias, origem, sexualidade ou religião apenas por essas características.
Nos tratamentos não universalizados, deve existir uma finalidade justificada por exigências da razão pública. Não basta, por exemplo, mero apelo a tradições, por mais arraigadas que sejam, a menos que seja para restaurar uma injustiça histórica. (o próprio conceito de injustiça e os meios de restaurá-la devem passar pelo crivo daquela razão). O privilégio deve acabar com outro privilégio.
Entretanto, toda reparação de injustiça gera injustiça. Por exemplo, o sistema de cotas raciais em universidades exclui pessoas igualmente desprotegidas pela sorte e fortuna, de acesso ao ensino superior.
Os sistemas políticos e jurídicos acabam fazendo um cálculo utilitarista do mal menor, segundo os padrões de justiça em vigor. Esses padrões requerem expressividade política que, por sua vez, precisam de visibilidade social e também política. Não adianta a pura e simples indignação dos que se sentem excluídos ou injustiçados. É preciso organização e luta.
O movimento negro teve e tem esse mérito. Mostrou com números e vozes que pobreza tem cor. Sabemos, todavia, que, em país mestiço, há outras vozes que precisam ser ouvidas. Mas, para isso, têm de gritar. De saber gritar.
Quando vi o índio Araju Sepeti interromper o julgamento do STF sobre a constitucionalidade das cotas universitárias, reivindicando que os ministros se lembrassem que eles também, os índios, não eram invisíveis, tive a primeira reação de repulsa, culpa da tradição, para, em seguida, exultar. 
Seus gritos, claro, contrários aos protocolos, desejavam a ampliação de suas cotas (pequenas, comparadas às dos negros e pardos) e algo bem mais simples: a simples menção a eles, os índios, esquecidos nos votos e menções. Sim, os índios existem.
Para mim, a cena foi tão ou mais importante que a argumentação e as conclusões dos ministros. Apenas quem tem voz é lembrado, mesmo que, em princípio, seja expulso do recinto. Apenas quem é lembrado tem vez, mesmo que a história lhe tenha deixado um legado de esquecimento.




fonte: José Adércio Leite Sampaio


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