Taveira's Advogados

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sábado, 24 de março de 2012

Contratos aleatórios.

Contratos aleatórios – Art. 458 a 461

Conceito e espécies
Contrato aleatório é aquele contrato oneroso em que não há certeza da existência da contraprestação ou da extensão desta. Contrariamente ao contrato comutativo, não há equivalência entre a prestação das partes, pois os contratos aleatórios são marcados pela presença da álea (sorte) ou risco.

Em alguns tipos de contratos, o risco é inerente ao próprio tipo contratual. Se o risco não existisse, o próprio contrato perderia sua razão de ser. Assim, são exemplos de contrato tipicamente aleatórios o seguro, o jogo e a aposta. Enquanto no jogo e aposta a álea tem caráter especulativo, no contrato de seguro o caráter é preventivo. Se inexistisse o risco, o jogo não existiria.

Além dos contratos tipicamente aleatórios, temos os contratos que são, por sua natureza, comutativos, mas que podem ser transformados em aleatórios pela vontade das partes. Exemplo clássico é o da compra e venda de coisas futuras. Neste caso, o risco pode dizer respeito à existência da própria coisa (emptio spei) ou apenas da quantidade da coisa (emptio rei speratae).

Risco com relação à existência da própria coisa objeto do contrato (emptio spei)
Nesta espécie de contrato aleatório, a contraprestação é devida ainda que a prestação não venha a existir, pois o risco diz respeito à existência do objeto (CC, art. 458). O comprador assume o risco de pagar o preço ainda que a coisa não venha a existir.

O pagamento do preço, nesta hipótese, não terá como causa a entrega da coisa futura em virtude do risco assumido pelo comprador. Não se vende a coisa propriamente dita, mas apenas a possibilidade de ela vir a existir.

O melhor exemplo é o contrato de venda de toda a safra futura. Se o comprador assume o risco pela existência de toda a safra futura, paga o preço ao vendedor, ainda que a safra se frustre em razão de uma forte seca que assolou a região. Entretanto, se o contratante age com dolo ou culpa e em razão disto a coisa inexiste, o outro contratante não está obrigado a cumprir com a sua parte no contrato.

Assim, se a safra futura se frustra em razão de uma praga bastante conhecida (broca da laranja, por exemplo) pelo fato de o vendedor não ter-se precavido por meio de pulverização, não poderá este exigir o pagamento do comprador, pois houve perda da coisa por culpa sua.

Risco com relação à quantidade da coisa futura (emptio rei speratae)
Nesta hipótese, parte-se da premissa de que a coisa objeto do contrato existirá em qualquer quantidade e que, portanto, o preço é devido e não sofre alteração ainda que a quantidade seja menor ou maior do que se esperava (CC, art. 459).

Ao contrário do que ocorre na hipótese anterior, o risco assumido diz respeito à quantidade da coisa, mas não com relação à sua existência. Se nada vier a existir, a alienação se desfaz e o preço não será devido (CC, art. 459, parágrafo único).

Se o contrato contiver a previsão de que se adquire o que vier da rede lançada ao mar pelo pescador, desde que algo venha, pagando-lhe R$ 100,00, teremos a seguinte conseqüência:
·         Se nada vier, a compra e venda está desfeita (resolução) e o comprador não terá que pagar o preço;
·         Se a rede contiver apenas um peixe, o comprador continua a pagar o preço.

O comprador só se livra do pagamento do preço se houver culpa da outra parte na quantidade da coisa obtida. Assim, se o pescador lança a rede que está cheia de furos e poucos são os peixes pescados por esta razão, pode o comprador não efetuar o pagamento do preço.

Risco com relação à coisa já existente
A terceira hipótese de contrato aleatório previsto em lei diz respeito aos casos de que a coisa existe (não se trata de coisa futura), mas está exposta a um risco.

Imaginemos o caso de o dono de certo imóvel ser réu em ação reivindicatória pela qual um terceiro alega ser verdadeiro proprietário da coisa. Se o réu na ação em questão resolver vender a casa e avisar ao comprador que a coisa existe, mas há riscos de ocorrer sua perda em razão da demanda, estamos diante de um contrato aleatório.

Também, se o alienante avisa o adquirente que a mercadoria está bloqueada no porto em razão de greve dos portuários e que, em razão da demora na liberação, poderá estar com a data de validade vencida, e este aceita assumir os riscos (certamente negociando redução de preço com o primeiro), o negócio é válido e o preço deve ser pago, mesmo que a greve demore muitos meses e a validade dos produtos se expire.

Assim, se o adquirente, ciente do risco de perda total ou parcial da coisa, assume o risco, o alienante terá direito ao valor integral do preço, ainda que a coisa pereça total ou parcialmente (CC, art. 460). Não responderá o alienante por evicção, nem por qualquer outro dano que a coisa venha a sofrer.

Entretanto, a lei determina ser nulo o contrato em questão, se na data da contratação o risco já havia se consumado e o contratante disto tinha ciência (CC, art. 461). A lei não poderia prestigiar a má-fé do contratante que, ciente de que o risco já se consumou, não informa o outro contratante e celebra o contrato.

Retomemos o exemplo da mercadoria do navio em questão. Se o vendedor, na data do contrato, já sabe que o prazo de validade da mercadoria expirou, e dolosamente oculta tal fato do comprador, não terá direito ao preço, pois o risco já tinha se consumado. Neste caso, o risco não mais existia em razão de o evento estar consumado.

Da mesma forma, se determinado vendedor aliena um lote de mercadorias que está no Iraque e, em razão da guerra, ocorre riscos de não conseguir sair do país, o comprador que assume o risco pagará o valor, ainda que a mercadoria não chegue a seu destino. Entretanto, se o vendedor, na data do contrato, já sabia que a mercadoria fora destruída durante a guerra (o risco já se consumou), perde o direito ao preço, diante de sua evidente má-fé.

Prevê a lei que se trata de anulação do contrato por dolo do contratante. Na realidade, se a coisa já não existe em razão do risco, o contrato tem um vício na sua formação, qual seja, a inexistência do objeto, ferindo o disposto no art. 104 do atual Código Civil.  

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