O site de buscas Google foi liberado da obrigação de
restringir suas pesquisas referentes à apresentadora de TV Xuxa Meneghel
associada ao termo “pedófila”. A decisão foi dada de forma unânime pela
Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em ação movida pela
apresentadora contra a empresa de serviços on-line. A Turma acompanhou
integralmente o voto da relatora do processo, ministra Nancy Andrighi.
A
apresentadora entrou na Justiça contra o Google pedindo que o site fosse
impedido de disponibilizar resultados de pesquisas feitas com a expressão “Xuxa
pedófila” ou qualquer outra que a associasse a algum termo correlato. Muitos
dos sites encontrados nessas pesquisas referem-se ao filme “Amor Estranho
Amor”, de 1982, dirigido por Walter Hugo Khouri, no qual a apresentadora (então
atriz e modelo) contracena em situação erótica com um menino.
Ao
julgar pedido de antecipação de tutela, o juiz de primeira instância determinou
que a Google Brasil Internet Ltda. não disponibilizasse resultados de pesquisas
e imagens associando a apresentadora à expressão “pedófila”. A proibição se
estendia também a qualquer resultado de pesquisas pelos nomes “Xuxa” e “Xuxa
Meneghel”, ou expressões com grafia parecida.
O juiz
fixou multa de R$ 20 mil para cada resultado apresentado nas pesquisas. Após
recurso da empresa, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) determinou
que apenas determinadas imagens fossem restringidas, permitindo a exibição dos
links, e manteve a multa.
Já no
STJ, a empresa alegou que se aplicaria ao caso o artigo 248 do Código Civil,
que determina que obrigações impostas judicialmente, quando impossíveis de
serem cumpridas, devem ser consideradas como resolvidas. Alegou que não há
tecnologia disponível para censurar expressões e imagens de forma tão
específica. Além disso, o site da Google não é de notícias ou fofocas e sim um
organizador de informações da internet. O advogado da empresa comparou a ação a
um ataque contra o índice de uma biblioteca por se discordar do conteúdo dos
livros. Ele apontou que o índice poderia ser suprimido, mas os livros iriam
continuar lá.
A
ministra Nancy Andrighi destacou que é a primeira vez que o tema de conteúdo
on-line ofensivo, em relação a sites de busca, é tratado no STJ. Ela apontou,
inicialmente, que há relação de consumo entre o usuário e os buscadores da
internet, mesmo sendo o serviço oferecido gratuitamente. Entretanto,
prosseguiu, não se pode considerar defeituoso (nos termos do Código de Defesa
do Consumidor) o site de busca que não tem um controle prévio sobre o resultado
de suas pesquisas. Seria, portanto, fundamental determinar o limite de
responsabilidade da empresa que presta esse tipo de serviço on-line.
Essa
responsabilidade, asseverou a relatora, deve ser restrita à natureza das
atividades desenvolvidas pela empresa. Ela observou que o provedor de pesquisa
“não inclui, hospeda, organiza ou de qualquer outra forma gerencia as páginas
virtuais indicadas nos resultados disponibilizados, limitando-se a indicar
links onde podem ser encontrados os termos de busca fornecidos pelo próprio
usuário”.
“No que
tange à filtragem do conteúdo das pesquisas feitas por cada usuário, não se
trata de atividade intrínseca ao serviço prestado”, esclareceu. Além disso, há
a questão da impossibilidade técnica do pedido. Ela apontou que, pela própria
subjetividade do dano moral, seria impossível determinar parâmetros que
pudessem ser utilizados por máquinas para filtrar a pesquisa.
A
ministra destacou que os outros casos tratados no STJ se referiam a páginas que
têm controle sobre o próprio conteúdo, como as de rede social. Para a ministra,
exigir uma censura prévia dos sites de pesquisa seria restringir uma das mais
importantes características da internet, ou seja, a possibilidade de
disponibilizar dados on-line em tempo real. Acrescentou que os sites de busca
pesquisam no universo virtual, em que o acesso é público e irrestrito, e onde
estão disponíveis até mesmo dados ilícitos.
A
ministra reconheceu a dificuldade de acionar cada uma das páginas que tenham conteúdo
inadequado, mas afirmou que, identificado o endereço eletrônico da página, não
há razão para que se acione na Justiça o site de pesquisa que apenas facilita o
acesso ao material disponibilizado publicamente na internet. Ela ponderou
também que uma restrição tão severa à pesquisa, da forma como fora determinada
pelo juiz, poderia dificultar a divulgação do próprio trabalho da
apresentadora.
Nancy
Andrighi disse ainda que, a pretexto de impedir a propagação de conteúdo
ilícito ou ofensivo, “não se pode reprimir o direito da coletividade à
informação”. Segundo ela, entre o direito social à informação e o direito à
intimidade de um indivíduo, deve prevalecer o primeiro. “Não é uma solução
perfeita, mas é a possível no momento”, concluiu.